Alice Brill, Claudia Andujar, Gertrudes Altschul, Hildegard Rosenthal, Lily Sverner, Madalena Schwartz e Stefania Brill. À profusão de nomes, somaram-se proveniências, costumes, línguas e sotaques. Colônia, Neuchâtel, Berlim, Zurique, Antuérpia, Budapeste. Alemão, francês, húngaro, iídiche e polonês. Histórias e trajetórias que, aparentemente, configurariam um mapa disperso, encontram-se em um destino comum: São Paulo.
Fugindo da perseguição nazista que assolava a Europa e que impôs a migração forçada elas chegaram no Brasil e se instalaram em São Paulo logo nas primeiras décadas do século XX. A cidade que escolheram como nova morada estava vinculada, naquele momento, à imagem estereotipada de “maior centro industrial da América Latina”. Entre verdade e promessa, província e metrópole, essa cidade em vertiginosa transformação passou a abrigar uma diáspora judaica e estrangeira que trazia na bagagem não apenas o sentido do exílio, mas também o vocabulário formal das vanguardas artísticas europeias.
Alice, Claudia, Gertrudes, Hildegard, Lily, Madalena e Stefania encontraram nos entraves da língua e no caráter democrático da fotografia um caminho para uma prática e para uma profissão. Com seus espíritos ousados e inventivos, cada uma no seu tempo e a seu modo, desenvolveram uma concepção de moderno. Lançando-se em um campo majoritariamente masculino, percorreram essa cidade e seus espaços, experimentando, registrando e construindo novas perspectivas.
Quase nada escapou a seus olhares: em diferentes escalas e composições, estão presentes a arquitetura e a construção civil, a precariedade do trabalho e da moradia, o fluxo urbano e migratório, o comércio formal e informal, a cultura, o lazer e a vida noturna paulistana. Porém, é no cotidiano, nas esperas e hesitações, nos tempos “mortos” que escapam ao frenesi do progresso, nos gestos lúdicos e miúdos do dia a dia, que essas mulheres compuseram uma vasta e pujante iconografia de São Paulo.
Por meio das trocas de olhares que denunciam a presença tanto da fotógrafa como do aparato, de retratos prosaicos de trabalhadores e transeuntes, de flagrantes de passageiros em transportes coletivos, vendedores ambulantes, jornaleiros, frequentadores de bares e confeitarias, crianças e idosos, elas edificaram um imaginário poético da cidade.
Modernas! São Paulo vista por elas narra cerca de cinquenta anos da história de São Paulo por meio do pioneirismo de fotógrafas mulheres cuja lente, cosmopolita e estrangeira, contribuiu incontornavelmente para a modernização da fotografia brasileira e para a construção de um outro imaginário da cidade e de seus habitantes. Longe de querer buscar por um suposto “olhar feminino”, trata-se aqui de evidenciar cada uma dessas fotógrafas por meio de suas singularidades, conexões e diferenças. Graças a elas, mulheres e estrangeiras, novas e fecundas abordagens à vasta iconografia sobre a modernização da capital paulista foram erigidas.
Ainda que afinadas a preceitos estéticos modernos, Alice, Claudia, Gertrudes, Hildegard, Lily, Madalena e Stefania souberam olhar na contramão dos discursos que atrelavam a modernidade a uma monumental sinfonia urbana, deslocando-se criticamente de uma visão desenvolvimentista e ufanista do progresso. Por isso, o conjunto de suas produções aqui apresentado constitui, pode-se dizer, uma modernidade dentro da modernidade, ganhando destaque uma espécie de convite ao descanso, ao lirismo e ao encontro.
Ilana Feldman e Priscyla Gomes